Acessibilidade ao tratamento médico com a cannabis: obstáculos transponíveis e pontes indestrutíveis, sob análise da história do Brasil e da lei brasileira
14 de maio de 2024 2024-05-22 8:34Acessibilidade ao tratamento médico com a cannabis: obstáculos transponíveis e pontes indestrutíveis, sob análise da história do Brasil e da lei brasileira

Acessibilidade ao tratamento médico com a cannabis: obstáculos transponíveis e pontes indestrutíveis, sob análise da história do Brasil e da lei brasileira
por Maria Eduarda Lages Rocha
A acessibilidade ao tratamento médico com cannabis no Brasil é um tema complexo que demanda uma análise abrangente, considerando tanto a história do país quanto a legislação vigente. A planta de cannabis possui uma longa presença na história brasileira, remontando aos tempos coloniais, quando teria sido introduzida por negros escravizados no século XVI.
Historicamente, a proibição da cannabis no Brasil foi influenciada por políticas globais antidrogas, sendo consolidada na década de 1930. Essa abordagem repressiva impactou a percepção da planta, resultando em estigmas que persistem até os dias atuais. No entanto, recentemente, houve avanços na legislação brasileira, especialmente com a Resolução da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) de 2019, que autoriza a prescrição de produtos à base de cannabis por profissionais de saúde.
Apesar desses avanços, diversos obstáculos persistem. A falta de pesquisas clínicas nacionais sobre os benefícios medicinais da cannabis limita a fundamentação científica para a prescrição. Além disso, o alto custo dos produtos à base de cannabis e a ausência de cobertura por planos de saúde dificultam o acesso para muitos pacientes, perpetuando desigualdades no tratamento.
A resistência cultural e os estigmas associados à cannabis também desempenham um papel crucial na dificuldade de aceitação e regulamentação. É fundamental abordar esses preconceitos por meio de iniciativas educacionais e de conscientização, visando dissipar informações incorretas e promover uma visão mais objetiva sobre o uso medicinal da planta.
A análise da legislação, especificamente a Lei 11.343/06, revela uma lacuna entre a permissão legal para o uso medicinal da cannabis e sua efetiva implementação. Os protocolos estabelecidos pela ANVISA, embora representem um avanço, mostram-se insuficientes diante da demanda crescente por tratamentos à base de cannabis.
A judicialização da questão, com casos de concessão de habeas corpus para cultivo próprio ou importação de produtos, demonstra a busca individual por acesso ao tratamento, muitas vezes em contraposição às limitações impostas pela legislação. No entanto, essa abordagem fragmentada não resolve os desafios sistêmicos que afetam a acessibilidade em larga escala.
A urgência de um debate mais amplo sobre a cannabis no Brasil é evidente, considerando a necessidade de efetivar o direito à saúde e à liberdade individual, conforme preconizado pela Constituição Federal de 1988. A construção de pontes indestrutíveis nesse contexto implica em uma abordagem colaborativa entre diversos atores, como profissionais de saúde, pesquisadores, pacientes, organizações da sociedade civil e legisladores.
Além disso, a compreensão da história da cannabis no Brasil, desde sua introdução até os dias atuais, é crucial para contextualizar os desafios atuais. Uma abordagem holística, que considere tanto os aspectos legais quanto os sociais e culturais, é essencial para superar obstáculos e construir uma estrutura regulatória mais inclusiva e eficaz. A acessibilidade ao tratamento médico com cannabis no Brasil depende, portanto, não apenas da superação de obstáculos, mas da construção de pontes sólidas que conectem o passado, o presente e o futuro desse importante discussão.
(Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito, do Departamento de Ciências Jurídicas da Universidade Federal do Piauí, como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Direito.)